SOBRE A EDUCAÇÃO DAS CRIANÇAS
por Aleister Crowley
I
Cada criança deve desenvolver a sua própria Individualidade e Vontade, desconsiderando Ideais alheios.
Na Abadia de Thelema em Céfalu os seus recursos e sua originalidade são confrontados com diversos ambientes.
Ela é confrontada com problemas tais como natação, escalada, trabalho de casa, e lhe é permitido resolvê-los do seu próprio jeito.
Seu subconsciente é impressionado pela leitura de obras primas da literatura, que se permitem infiltrar na sua mente automaticamente, sem estresse seletivo e sem exigir compreensão consciente.
Nada é ensinado, exceto Como pensar por si mesmo.
Ela é tratada como um ser responsável e independente, encorajada na autossuficiência e é respeitada na sua autoafirmação.
II
Educação é ajudar uma alma a se expressar por si mesma. Toda criança deve ser confrontada com todos os problemas possíveis e lhe deve ser permitido fixar mentalmente as suas próprias reações; deve-se fazer com que ela enfrente todas as contingências uma após a outra até que ela supere a cada uma com sucesso.
Sua mente não deve ser influenciada, somente lhe devem ser oferecidos todos os tipos de nutrição. Suas qualidades inatas a capacitarão a selecionar o alimento adequado à sua natureza.
Respeite a sua individualidade! Submeta toda a vida para sua apreciação, sem comentários.
A verdade ensina a compreensão, a liberdade desenvolve a vontade, a experiência confere desenvoltura, a independência inspira autoconfiança. Assim o sucesso será garantido.
III
Toda criança é o Deus do seu próprio Universo. A educação desenvolve o controle sobre este.
Nada deve ser ensinado exceto como controlar o seu meio ambiente. A verdade é a primeira condição; ela deve observar todos os fatos cientificamente.
Coragem, a segunda; ela deve abordar todos os fatos resolutamente.
Organização, a terceira; ela deve integrar impressões e ordem.
Deve ser permitida a ela autoridade absoluta sobre suas reações, porém a sua tendência em se iludir ou evadir realmente devem ser cauterizadas através do confronto insistente com as realidades repugnantes.
Ela deve conhecer claramente, ousar sem temor, querer integralmente e silenciar completamente. IV
A educação prepara os indivíduos para enfrentar as circunstâncias.
Desde a infância as crianças devem encarar os fatos, não adulterados por explicações. Que elas pensem e ajam por si mesmas; que a sua integridade inata se manifeste! Faça-as explorar todos os mistérios da vida, superar todos os seus perigos.
Falsidade e medo são os seus únicos inimigos.
Que elas presenciem nascimento, casamento, morte; que elas ouçam poesia, filosofia, história; force o entendimento, mas não a sua expressão articulada. Faça-as enfrentar penhascos, as ondas do mar, animais, descobrindo a sua própria fórmula de conquista.
Imponha a Verdade a elas incansavelmente, tomando cuidado apenas para fazer com que seu alcance seja totalmente abrangente; deixe a seu encargo o uso dela.
V
Que as crianças se eduquem para serem elas mesmas. Aqueles que as treinam para os padrões as mutilam e deformam. Os ideais alheios impõe perversões parasitárias.
Toda criança é uma Esfinge; ninguém conhece seu segredo a não ser ela mesma; tem a presunção Ignorante de iniciar Isis?
Que a Esfinge medite sobre o seu segredo até a sua hora; pode-se ajudá-la apenas deixando-a contemplar a existência. Que ela observe todas as coisas na Terra e no Céu.
Proteja-a contra a violação; fortaleça-a com lutas sucessivas. Que ela seja onisciente, onipotente, aperfeiçoada pela sua própria Virtude para servir aos seus próprios propósitos — individual, independente, iniciada — Ela mesma!
VI
Professores Procrustianos2, supondo a Si Mesmos como sendo a “Medida da Humanidade”, deformam as crianças deliberadamente através de Ideais.
Os jardineiros nunca tratam papoulas como tomates; eles nutrem cada planta conforme o seu próprio modo de ser, buscando a excelência nas suas características particulares.
Mesmo a educação elementar deve ser adaptada aos indivíduos; cada mente tem as suas próprias peculiaridades. Por que não colocar os corpos dos garotos em moldes de gesso de “Perfeição”?
Toda pressão sobre material plástico é perniciosa, impedindo as suas verdadeiras tendências, e pervertendo as suas proporções. Crescimentos disformes compensam as compressões.
A educação deve acostumar a mente a enfrentar todas as eventualidades, interpretando, julgando e reagindo conforme a sua necessidade individual exigir.
VII
A maioria das pessoas corrompe as crianças propositadamente, alegando a necessidade de protegê-las. A falsidade confunde as concepções corretas; o cérebro, aturdido, logo encontra evidência conflitante. A contradição entre os fatos observados e o ensinamento revolta a sua integridade.
As crianças desconfiam do Universo; a inteligência se revolta; anos de dolorosa incerteza se vingam da decepção original. As crianças também são treinadas para falsificar, sofisticar, negar ou esquecer os fatos; proibidas de encará-los.
Empunhando as armas erradas, elas se defrontam com inimigos desconhecidos ou desorientados.
A natureza se torna traidora; elas desconfiam de si mesmas; como o trapaceiro do bilhar de Gilbert, eles jogam “sobre um pano falso com um taco retorcido e bolas de bilhar ovais”.
VIII
Na Abadia de Thelema em Céfalu as crianças são como adultos. As realidades são seu direito; elas observam sem paixão e agem com responsabilidade. Elas são induzidas a se desenredar de emergências progressivas. Elas se exercitam, nadam, escalam, jogam, exploram sozinhas a cidade ou o campo; elas ouvem palavras confiáveis. Elas usam as suas mentes adequadamente, nunca de maneira forçada.
Elas aprendem a enxergar a verdade, ter coragem, cortesia e independência; a se preocupar com seus próprios assuntos, respeitando os direitos dos outros, e ao mesmo tempo se ressentem com interferências.
Compreendendo as realidades com exatidão e agindo adequadamente sobre estas, ao invés de chorar, se apegar, se diminuir, e “fingir”, elas controlam a si mesmas e ao ambiente.
IX
Os cérebros jovens armazenam impressões sensoriais sem necessariamente julgá-los. As faculdades mentais superiores se desenvolvem gradualmente.
É um ato criminoso forçar o crescimento, especialmente em direções dogmáticas. Reflexão, classificação, coordenação são instrumentos da mente em crescimento para lidar com acúmulos de detalhes. A educação deve simplesmente fornecer os fatos, inteligíveis ou não, de toda ordem. Evite comentário, explicação, julgamento moral; a mente infantil deve administrar o seu material.
A verdade deve ser ensinada como condição de relação correta, e a coragem como a de reação correta.
O indivíduo igual ao seu ambiente se desenvolve com perfeição. Crianças assim educadas são absolutamente elas mesmas, ajustadas para compreender e agir através de evolução autônoma.
X
A evolução exige indivíduos excepcionais, mais adaptados ao seu meio ambiente do que seus pares. A espécie prospera ao imitar os excêntricos competentes.
A mediocridade, a pretensa moralidade, protegem o inapto, mas evitam o progresso, desencorajam a adaptabilidade e garantem a completa ruína para a raça.
Padrões de educação, ideais de Certo-e-Errado, convenções, credos, códigos, Humanidade estagnada. Estimule indivíduos originais. Cuidado para não desajustar a Pedra Angular, ou jogá-la no meio do entulho!
A mediocridade queria que Keats fosse boticário, Gaugin um banqueiro, Clive um balconista, Maomé um condutor de camelo!
A natureza necessita de nobreza.
A vitalidade reivindica variedade.
A eminência conquista o progresso.
A superioridade garante a sobrevivência.
A excentricidade evita a atrofia.
Uma ninhada para Behemoth5!
XI
Toda criança é absoluta.
Não ouse influenciá-la ou restringi-la!
Dê à semente condições de germinar!
Na maturidade, a sua mente
Aprimorará seu fruto adequado,
Autodeterminado, autodesignado!
Ousas tu desviar aquela sensibilidade
Para as tuas fantasias ou teorias?
Quem ordenou a ti para avaliar
Maravilhas ocultas aos teus olhos?
Intrometido, enlameado! A tua conjetura
Garante a mais prodigiosa sabedoria?
Que ela conheça e avalie as coisas,
Compare-se com elas, cruze
Com segurança o abismo—A terra canta:
“Se você sabe e quer, você pode!”